Chuvas no Rio: Reportagem completa e o relato exclusivo de quem viveu o caos de perto

Criado por Letícia Castro em em 12/04/2010

NOTA: Se você chegou aqui através do Google, provavelmente está buscando informações sobre as recentes chuvas que estão assolando o estado do Rio de Janeiro. Como o texto abaixo se refere ao mesmo fenômeno que aconteceu em 2010, aqui está o link do post mais recente do Babel, com uma lista de reportagens sobre como ajudar as vítimas desta nova tragédia que se repete em 2011:

Saiba como fazer doações para as vítimas das chuvas no Rio

Obrigada e vamos ajudar!

Faz uma semana que o Rio de Janeiro passou pela pior catástrofe natural devido a fortes chuvas, de toda a sua história. Só em um período de 24 horas, de acordo com a prefeitura, choveu 288 milímetros, o maior índice já registrado na cidade. As imagens da catástrofe e a repercussão na imprensa chocaram o mundo todo com o flagelo sofrido pela população carioca desde que a primeira notícia, dando conta dos estragos ocasionados pela chuva, foi divulgada em 6 de abril último. De lá para cá, as atenções foram todas direcionadas para o que acontecia dia-a-dia na capital fluminense e a situação só tendia a se agravar a cada minuto.
Não se falou de outra coisa: as chuvas no Rio foram o triste assunto priorizado nos noticiários, meios impressos e conversas entre as pessoas. Ainda hoje, os perigos de deslizamentos de terra preocupam os moradores das encostas dos morros e o alerta de chuva anuncia que, mesmo em menor intensidade, as precipitações ainda devem continuar nos próximos dias. Veja abaixo os últimos números gerais contabilizando a tragédia até agora:

- 229 mortos em decorrência das chuvas no estado: 146 em Niterói – o município mais atingido – 63 no Rio de Janeiro, 16 em São Gonçalo e uma em cada uma das seguintes cidades: Magé, Nilópolis, Paracambi e Petrópolis

- mais de 160 feridos, o que faz chegar a 390 o número de pessoas atingidas pelos temporais

- mais de 52 mil pessoas fora de casa a por causa das tempestades

- 40.482 desalojados em todo o estado

- 11.562 desabrigados: São Gonçalo tem o maior número de desalojados (8.718)

Por que choveu tanto?

De acordo com os meteorologistas, uma massa incomum de ar quente e úmida chegou ao Rio de Janeiro na semana passada, favorecendo a formação dos temporais devastadores. A alta quantidade de umidade na Amazônia potencializou a chuva que atingiu o estado e, antes disso, o Rio também passava por um período de calor e de alta umidade. A combinação de todos esses fatores foi a causa das fortes precipitações que nunca haviam ocorrido sobre a cidade.

Por que os danos ocasionados pelas chuvas foram tão graves?

Além do índice pluviométrico exageradamente alto, os danos causados pelas fortes chuvas no Rio da semana passada foram intensificados por outras causas que, combinadas, agravaram ainda mais a situação:

- construções irregulares nas encostas dos morros – inclusive sobre depósitos de lixo – provocando deslizamentos e número elevado de mortes

- a falta de providência por parte dos governantes que não fizeram a prevenção contra incidentes como este, promovendo a remoção da população das áreas de risco

- acúmulo de lixo pela cidade, o que impede o escoamento das águas pelas redes de esgoto (problema comum nas grandes cidades brasileiras)

O deslizamento do morro do Bumba

Na noite de 7 de abril, ocorreu o deslizamento que vitimou mais pessoas em decorrência das chuvas do Rio. Já subiu para 39 o número de mortos no morro do Bumba, em Niterói, e a causa pode ter sido duas fissuras na rocha que detonaram o soterramento de centenas de pessoas, segundo estimativas. Um estudo feito por geógrafos da PUC-Rio, pedido pelo DRM (Departamento de Recursos Minerais do Rio) corrobora a conclusão.

No local, funcionava um antigo lixão, desativado há mais de 50 anos. Segundo os geógrafos, o desastre não teria alcançado a mesma proporção se não tivessem tantas casas erguidas sobre o depósito.

A história por quem a viveu de perto


O temporal no Rio de Janeiro, registrado por Jorge Fortunato
Jorge Fortunato, administrador de empresas e responsável pelo blog Acabou o Caviar?

Jorge relata a sua experiência desde o início do primeiro temporal e toda a repercussão, mais tarde, ao longo da semana:

“Saí do trabalho na Urca por volta de 17h15 e o tempo estava bastante fechado. Quando cheguei no Flamengo, bairro onde moro já começara a chover. Ignorei a chuva e fui ao supermercado. Quando saí, a chuva já havia aumentado bastante, preferi não esperar passar (ainda bem) e segui para casa. À medida que caminhava, mais a chuva e o vento aumentavam. Finalmente, cheguei no meu prédio, tênis ensopado e metade da calça bem molhada. Pensei que fosse apenas um temporal rápido, mas a chuva não parava.

Durante a madrugada, acordei e ainda chovia. No dia seguinte, ao ligar a TV, mal podia acreditar nas imagens que via pela televisão. Destruição e mortes, tanto no Rio como na cidade vizinha, Niterói. Parte da minha rua estava alagada. Na Praia do Flamengo não via movimento de ônibus. Na televisão, o prefeito pedia para que ninguém saísse de casa. Apesar de um trecho da minha rua estar alagado, isso não iria impedir que eu saísse de casa. Só iria esperar que desentupissem os bueiros e a água escorrresse. Não iria chegar no horário habitual, mas também não precisava ficar em casa. Moro muito perto. Ônibus e metrô não seriam a minha escolha, um táxi seria melhor.

Por volta de 10h20, saí de casa e peguei um táxi. Assim que parou, o motorista quis saber o meu destino. Se fosse Botafogo, ele não iria, as ruas estavam alagadas, informou. Como ia para a Urca, tudo bem. A sensação era de que estava num dia de feriado. Ruas vazias, pontos de ônibus com poucas pessoas e incrível: poucos carros e ônibus. Levei 10 minutos para chegar até a Urca. Num dia normal, com o volume de carros, poderia levar muito mais, mesmo de táxi. Felizmente, onde moro não houve nenhum tipo de tragédia, apenas alguns bueiros entupidos e alagamentos, o que não é nada diante de tanta dor e sofirmento.”

Paulo Araújo, analista de telecomunicações e responsável pelo blog Cine Planeta.

“Graças a Deus, na segunda-feira eu já estava em casa, pois saí mais cedo do trabalho. Fui informado que choveria muito e onde eu trabalho, no Rio Comprido, toda vez que chove, sempre enche muito. Pessoas que trabalham na minha empresa dormiram no trabalho e só saíram no outro dia, às 10h00.

A cidade ficou um verdadeiro mar, todos os bairros alagados, Zona Sul, Centro e Zona Norte. Na terça-feira, eu não fui trabalhar, pois o prefeito pediu para que todos ficassem em casa. No meu trabalho, todos foram dispensados, na realidade ,a cidade parou. Não preciso nem dizer muita coisa, pois todos já sabem que foi um desespero total, não havia policiamento e não tínhamos como recorrer nem aos bombeiros.

Como moro na Zonal Sul, em um prédio, graças a Deus, nada aconteceu. Mais com relação à situação em geral, acho que alguma coisa tem que ser feita, não podemos ter mais pessoas morando em área de risco, se não vamos ter mais perdas de vidas.”

As chuvas registradas pelas câmeras dos moradores

5 de abril: o primeiro dia

6 de abril

Desabrigados: As primeiras providências
Em um primeiro esforço para tentar solucionar o caos instaurado na cidade, o prefeito Eduardo Paes já anunciou a remoção de mais de quatro mil pessoas, de aproximadamente oito comunidades de risco. As famílias deslocadas receberão o auxílio do aluguel social, no valor de R$ 400 e algumas casas já serão demolidas nesta segunda-feira. Alguns moradores das regiões atendidas também receberão casas pelo programa “Minha casa, minha vida”, do governo federal, outros poderão obter até 40% de indenização em cima do valor do imóvel.
Cuidados de agora em diante

Diante de situações de enchentes, a população deve tomar cuidados especiais para não agravar ainda mais os riscos para a sua saúde. Não enfrentar correntezas, não caminhar sobre áreas alagadas, ficar distante de árvores e postes caídos e informar a Defesa Civil em caso de danos nos imóveis são algumas das providências a se tomar em caso de inundações. Evitar ao máximo o contato com a água parada nas ruas também é aconselhável, já que impede que se contraia doenças como leptospirose, hepatite, diarreia e cólera.
Quem estiver circulando de carro pela cidade, deve evitar as ruas inundadas e informar-se sempre antes de sair quais são as vias desimpedidas para o trânsito. Em hipótese alguma, deve-se tentar atravessar áreas encobertas, seja com veículos altos ou baixos.

Se estiver na rua e começar a chover, evite ficar em lugares descobertos, mas nunca se proteja debaixo das árvores ou próximo das redes elétricas.

Donativos: Onde e como ajudar

O Babel disponibiliza para os seus leitores a lista elaborada no sábado passado pela redação do jornal Extra, do grupo O Globo (clique no link ao lado), com os locais que estão recebendo as doações para as vítimas das enchentes no Rio. Se você puder ajudar, dirija-se a algum desses postos e entregue a sua doação.

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Aqui se fala português.
Comentários (7)
  1. Jorge Fortunato comentou, em 12/04/2010:

    Bom dia Letícia
    Ótima a sua cobertura. Essa tragédia 9sempre anunciada) ficara ainda bom tempo marcaa nas vidas das pessoas. Niterói que´é considerada a 4a cidade do Brasil em qualidade de vida – salvo engano meu – está vivendo o seu pior momento. Os governantes agora tentam emendar o soneto, mas o estrago foi grande e claro, ninguém quer assumir as culpas. Hoje, Eduardo Paes, prefeito do Rio, começou a retirar pessoas das área de riscos, uma atitude que já deveria ser tomada há mais tempo, mas antes tarde do que nunca.
    Parabéns Lê.
    Beijos

    Responder
  2. cristina oliveira comentou, em 12/04/2010:

    parabéns!
    É difícil esta situação, mas as causas sempre são a mesma, se avaliarmos bem, somos os únicos culpados, governo e civis…

    Responder
  3. Wander Veroni comentou, em 12/04/2010:

    Oi Lê!

    Excelente matéria e com vários pontos de vista a cerca do que realmente aconteceu no Rio. Foi uma tragédia natural gigantesca, somada com a falta de educação do povo e dos governantes que ficam empurrando com a barriga os problemas da cidade.

    Muito legal os depoimentos do Paulo e do Jorge. Ficou super completa a sua reportagem, comadre. Parabéns!!!

    Beijos :)

    Responder
  4. Geraldo comentou, em 12/04/2010:

    Olá Letícia,

    Acompanhei horrorizado com as imagens da enchente, impressionante o que a chuva pode fazer com a uma cidade, foi um rastro de destruição.

    Abraço

    Responder
  5. Max Martins comentou, em 12/04/2010:

    Oi, Letícia!

    Realmente, essa situação é muito triste e pode acontecer novamente enquanto houver pessoas morando nas encostas dos morros. Isso só aconteceu devido à péssima distribuição de renda desse país. Enquanto não tivermos governantes que representem com dignidade o povo que os elegeu, tragédias como essa tendem a se repetir.
    Infelizmente, muitas pessoas não têm outra alternativa que não seja a ocupação de áreas de risco.
    Precisamos de arrumar muitas coisas em nosso país, mas isso só vai acontecer quando os “homens” no poder passarem a trabalhar pelo bem-estar da população e não, apenas, em benefício próprio.

    Excelente post! Parabéns!

    Um forte abraço

    Responder
  6. carla m. comentou, em 13/04/2010:

    Comadre,
    Demorei a ler a reportagem por que me dói ver o Rio, uma cidade que eu amo tanto, nesse horror. Passei o dia seguinte aos primeiros temporais colada ao telefone, tentando localizar os amigos. Terrível. E ninguém em áreas de risco, veja bem. Nem imagino o tormento de quem vive numa área dessas por lá.
    Parabéns pela reportagem.
    Beijo!!!

    Responder
  7. Mayara Caparroz comentou, em 14/04/2010:

    Meu Deus, se já foi um sufoco ver as imagens e notícias pela internet e tv, imagine só quem vivenciou essas tragédias de perto!

    A reportagem, está mesmo excelente.
    Parabéns, comadre!

    Beijos. :)

    Responder

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