Você tem muita coisa na cabeça

Criado por Letícia Castro em em 13/12/2013

mae-filhaTemos pessoas nas nossas vidas que, às vezes, não dizem o que queremos que elas digam em um determinado momento. Elas simplesmente não sabem, não conseguem, não têm essa habilidade, porque estão muito ocupadas. “Tem muita coisa na cabeça”, me disseram recentemente.

É. Deve ser muita coisa mesmo. Trocar fraldas, dar banho, alimentar, pôr pra dormir… Ensinar a andar, a escrever e a ler, atravessar a rua quando chega a hora de ir à escola aos dois anos e ficar esperando um “tchau” do outro lado, que nunca chega, porque os amiguinhos e o parquinho e a professora, tudo isso é muito mais excitante!

Deve ocupar muito tempo, certamente, fazer o bolo de aniversário mais delicioso do mundo. Aquele, dos sete anos, sem quebrar uma única unha. E obrigar a enxugar a louça ou arrumar a cama, ou ainda devolver o Sonho de Valsa surrupiado das Lojas Americanas, aos oito, confessando “o crime” publicamente ao gerente do estabelecimento. Criar um pessoa de bem deve realmente tomar o tempo dos outros…

Assim como ajudar a avó a fazer as cortinas e a colcha e as almofadas do sonhado quarto cor-de-rosa e levar ao McDonald’s pra comer o “número 1″, quando só o cheiro da lanchonete repugna o seu estômago. Ir buscar na rodoviária, segurando um buquê de flores para a viajante, recém-chegada da Europa, também é “time consuming”, digamos. Aliás, como todas as vezes em que você disse “sim” e o seu semblante demonstrava outra coisa.

Teve também as vezes em que você assentiu com muita iniciativa e disposição. Estas foram a maioria, aliás. Como quando você ajudou a consertar as faixas das becas das amigas no dia em que ela pegou o canudo. Ou quando lutou com a costureira – já com as unhas menos longas, mas os dentes mais afiados – para que ela tivesse a renda que queria, aquela francesa, cara pra burro, como a “mantilla” que lhe cobriria da cabeça aos pés de noiva. “Eu vou na São Caetano buscar, mas tem que ser a francesa”, disse você à costureira, no ateliê que fica a 400km de distância da Rua das Noivas.

Foi assim também naquele dia em que ela já havia se humilhado demais e você deu um basta na situação com um simples: “Chega”. Ah mas trabalho mesmo devia dar ser a mãe mais bonita da escola, reconhecidamente pela boca das professoras e das amiguinhas….

E é por isso que você se atropela tanto e nunca diz o que ela quer ouvir. São oito meses e quinze dias antes, 40 anos e nove meses depois,  de muitos “afazeres”. O interessante é que sempre sobra um tempinho, aí sim, de dizer aos outros (nunca diante dela): “A MINHA filha…!”.

É, você tem mesmo muita coisa na cabeça, mãe. E desconfio que a maioria delas entrou aí naquele 30 de março. Eu te amo.

Comentários (1)
  1. Flavya Pereira comentou, em 17/12/2013:

    Mães, por incrível que pareça, são incógnitas. Hora nos defendem com unhas e dentes. Nos protegem como se fôssemos bibelôs, como se fôssemos delas, como se sofressem de transtorno obsessivo compulsivo por nós, filhos. Mas quando estamos com elas. A gente sai, se aumenta e… somos esquecidos. Não há proteção, não há nãos, não há excessos, não há obsessão. A única coisa que há é uma vontade excessiva de um dia, do nada, é que na tela do telefone apareça “chamando MÃE”…

    Responder

Deixe uma resposta para Flavya Pereira Cancelar resposta