Início da produção em Tupi: 15 anos depois, a história muda mais uma vez no 1º de maio

Criado por Letícia Castro em em 01/05/2009

1º. de maio. Quinze anos depois daquele dia fatídico que mudaria a história do automobilismo brasileiro – mundial, pois se ele estivesse aqui, um certo alemão não teria se firmado nos pódios da Fórmula 1 com tanta folga, o Brasil avança mais um passo. Pra falar daquela época, basta lembrar que as manhãs de domingo prolongavam a excitação natural das noites de sábado, já que a festa se estendia um pouco mais com a farra que o Ayrton fazia nas pistas. Se não ganhava, a sua raça, fome e determinação garantiam que o brasileiro começasse a semana renovado, na crença de que sim era possível a um filho dessa terra triunfar e muito bem em solo estrangeiro. Não que não houvesse exemplos na terra de Pelé, mas Senna trazia gana nos olhos e uma única direção: ir em frente.

Eram outros tempos. Lançado há pouco mais de meses, o Plano Real ainda engatinhava e víamos um sociólogo fazendo milagres com a economia do país. Não era um sociólogo qualquer, não era um piloto qualquer, não seria um ano qualquer. O encadeamento dos fatos, ao longo daquele 1994, viriam comprovar que estava predestinado a acontecer. Não que a morte de Senna tenha sido responsável pelo êxito do plano econômico, não que ele tenha sido um mártir, não que ele não tenha sido um herói, não que naquele simbólico Dia do Trabalho não houvesse uma cruz naquela curva. Mas, não, não havia mesmo e a mais pura fatalidade conduziria os brasileiros a um estado de confusão e descrença – para não dizer revolta e inconformidade – com a sorte do jovem piloto que, descobrir-se-ia, para a surpresa geral, era um cidadão responsavelmente atuante e contribuía de forma larga com obras sociais significativas em seu país. Sempre de bandeira na mão.

O vazio esportivo que tomou conta de todos nós só se resolveria quase dois meses mais tarde, com o tetracampeonato nos Estados Unidos. Vinte e quatro anos depois, o Brasil, o país do futebol, símbolo da excelência no esporte no mundo todo, voltava a ser campeão. Uma geração inteira ainda não tinha tido o gosto de ver a seleção ganhar uma Copa do Mundo, eu entre eles. Vivia-se dos louros de México 70 e da gloriosa Seleção Canarinho que quase levou o título em 82. Mas, pra valer mesmo, nós todos nunca tínhamos visto. Era impossível não fazer referência ao gigante das pistas na vitória do futebol e a faixa aberta pelos jogadores, no meio do campo, fez tanto sentido como a taça. O brasileiro é movido à paixão e ali se conjugaram duas e respiramos aliviados. Parecia que a perda do herói de carne e osso finalmente se encaixava no nosso consciente e, com a auto-estima em riste, o brasileiro voltou a acreditar. E acreditou muito, acreditou tanto que mudou os rumos da história do seu país. É uma teoria, mas, particularmente, nada me tira da cabeça que foi tudo isso que fez o Plano Real dar certo e resolver, de uma vez por todas, os problemas históricos da economia no Brasil.

E por que falar de tudo isso hoje? Porque hoje, 1º. de maio de 2009, 15 anos depois, o Brasil dá mais uma guinada rumo ao seu destino. Não o destino do país nascido sob a luz dos conchavos monárquicos que nos entregaram a quase dois séculos de nadar e morrer na praia no cenário político e econômico mundiais. Não o destino do país mergulhado na escuridão da ditadura, financiada e abalizada pela Guerra Fria e os milhares de agentes da CIA infiltrados aqui, coordenando as ações de milicos desmiolados, abjetos sociais que nos submeteram à Idade das Trevas, versão local. Nós, os que sobrevivemos a tudo isso, carregamos cicatrizes e muitas mágoas e um rechaço veemente a esses tempos. Mas não desistimos nunca e somos chegados em chavões e enredos de novelas.

Nesse Dia do Trabalho, munidos de esperança renovada, os brasileiros mergulharam de novo, dessa vez na bacia de Santos, para dar a primeira picaretada rumo à extração do pré-sal. As expectativas são gigantes, como esse país – como aquele piloto – cheio de potencial, sempre potencialmente o maior, o melhor do mundo. Não creio que o brasileiro tenha pretensões imperialistas, ainda que nunca tenhamos estado nessa situação. Somos folgazões demais pra isso. No entanto, o que é nosso nos espera. E já vão séculos demais de letargia. Se o pré-sal vingará e corresponderá ao que se espera dele é assunto pra outro artigo daqui a alguns anos. Hoje, o que nos interessa é esse primeiro golpe no fundo do oceano. E esperar que os filhos dessa terra saibam utilizar da melhor maneira possível e em benefício próprio mais essa dádiva da natureza em uma terra que não se cansa de fazê-las brotar do nada. E que o exemplo de integridade e retidão deixado por Senna ilumine o caminho do que hoje se inicia. Espero, daqui a alguns anos, ter a sorte de escrever, também de maneira inspirada, sobre mais um simbólico 1º. de maio. Que seja bem-vindo.

Aqui se fala português (com muito orgulho)
Comentários (9)
  1. carla m. comentou, em 01/05/2009:

    Comadre, bela coluna política. Por sinal, quem me dera que fôssemos brindados todos os dias nos jornais com colunas tão bem pensadas, seria um alento.

    Como historiadora eu teria meia dúzia de divergências, mas algumas soariam políticas demais para que eu me escondesse atrás da autoridade da minha formação. Só tenho algo a dizer, mais por minha personalidade desconfiada que por todos as outras faces do meu eu: não chamaria os milicos que fizeram a ditadura de desmiolados. Alguns, como o FEBEAPÁ (Festival da Besteira que Assola o País, ótima sugestão de leitura) mostra bem eram sim, babacas. Mas a grande maioria era um bando de filhos da puta ( enão peço perdão pela expressão, acho que é até bondosa) bastante inteligentes e que sim, tiveram cooperação da CIA, mas não eram marionetes pura e simplesmente.

    De resto, se todo o otimismo de 1994 tivesse nos acompanhado na dureza da recessão que lhe seguiu, eu até me espantaria. Assim como vou me espantar se o otimismo da exploração do pré-sal nos acompanhar pelos duros tempode crise que se avizinham.

    E eu não ia falar e já falei. Mas tu sabes que não eprco uma oportunidade de interagir com um interlocutor inteligente, ainda mais se for pra criticar a nossa ordem política.

    Beijocas!!!

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  2. Marcelo Marinho comentou, em 01/05/2009:

    Letícia,
    inspirado texto. Eu e milhares de brasileiros vimos a morte do Senna, havia esquecido a data, não a morte. 1994 foi realmente um ano diferente na nossa história e lembrá-lo da forma maravilhosa que você lembrou foi ótimo. Tomara que no meio de tamanha crise mundial o Brasil se firme como um lugar diferenciado, bom de se viver, que nosso pre-sal seja um bom algúrio de coisas ainda melhores.

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  3. LETÍCIA CASTRO comentou, em 01/05/2009:

    Hehehe Comadre, comadre, a picaretada nem jorrou o dito ouro negro ainda, vamos confiar, bella! hehehe O que nos resta? :D Vai que sobra uma gotinha pra gente?!? hehehe

    E eu adorei a interação, viu? Só enriquece e valoriza o artigo, qualidade, povo, qualidade. ; )

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  4. Wander Veroni comentou, em 02/05/2009:

    Oi, Lê! Eu tô aqui babando com esse artigo…hehehe…a forma como vc costurou os assuntos ficou excelente, parabéns! Um editorial e tanto, viu! Me fez lembrar de um 1994 que foi muito diferente mesmo: cheio de acontecimentos que mudaram a história do nosso país.

    Bom, eu não lembro de muita coisa dessa época pq eu só tinha nove anos de idade, mas me lembro de forma muito vaga da morte do Senna, do Plano Real e da vitória da seleção…hehehe.

    A Copa do Mundo é o que ficou mais presente na minha cabeça pq estavam todos entusiasmados: as ruas enfeitadas e o sentimento verde-amarelo para tudo que era lado.

    Parabéns mais uma vez pelo texto! Quando eu crescer quero escrever tão bem como vc!

    Beijos :)

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  5. Renan Barreto comentou, em 02/05/2009:

    Nossa, Lê. Está simplesmente amazing seu artigo. 1994 foi realmente um ano muito importante para o Brasil. Os fatos e a corrente de eventos foi imprescindivel para o BRasil ser o que é HJ.

    O brasileiro adora ser o melhor do mundo em tudo. Tem que ter o melhor isso, o melhor aquilo. Acho que o Brasil é um EUA do sul, mas precisa se impor mais. A política externa do Lula é muito mais bem feita do que a do FHC, acho que pelo próprio carisma dele. Tenho que dar os parabéns para a assessoria de comunicação do presidente. rs

    Eu não posso dizer muito sobre 1994 não porque eu tinha uns 5 anos rsrs Aí fica dificil. Lembro que quando o Ayrton morreu eu queria uma mamadeira… rsrs com cinco anos.. rsrs

    Acho que o brasileiro junto à mídia precisa criar ícones, heróis para se sustentar. Bem, se isso é bom eu não sei, só sei que é assim como dizia Chicó do Suassuna rssrs

    Bjão!!!!

    There’s a new post on http://deepwithinasoul.blogspot.com See ya there. And thanks a lot for your kind words.

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  6. CG FILM PICTURES comentou, em 07/05/2009:

    O que dizer desse post? Ah, sensacional e bem informativo. Como tudo que vc escreve, parece que estou lendo um artigo da Veja,serinho, muito bom mesmo! Amarrando todo o texto ao que Ayrton fazia nas pistas. Que percurso maravilhoso o seu , isso sim, pilotou como ele. E merece a bandeirada no último ponto usado no parágrafo final. Incrível ( pausa p/ limpar a baba, se eu cuspir, mato o Cleiton afogado) Parabéns!
    Perdão minha querida , pela demora em te responder e vir fazer uma visitinha, mas estamos doidinhos aqui, preparando um documentário, então estamos um pouquinho atarraxados de coisas p/ fazer. ( cá entre nós, acho que Leôncio deu uma passadinha aqui, só por causa do meu telefonema daquele dia e já viu, né? Tronco na família. rsss)
    Mas tardamos e não falhamos, por isso estou aqui , te adoramos muito e prometo me tornar mais frequente assim que acabar essa fase de “coisa nova”. Beijinhos na bochecha de uma família que te ama de verdade.
    Beijinhosssssss

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  7. Ligia Gally comentou, em 09/05/2009:

    Le,

    O Senna eh, sempre foi e continuara sendo meu idolo.

    Seu texto me tocou…–)))

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  8. Viviane Righi comentou, em 12/05/2009:

    Olá, minha querida…
    Demorei, mas cheguei, rs…

    Quanto ao seu texto: E M O C I O N A N T E !
    De verdade.

    Além de super bem escrito e pertinente, foi de uma sensibilidade e de um bom gosto incríveis. Tocou fundo!

    Sabe, o que mais me fez viajar em seu texto foi a questão do nosso Senna, pois pensar nele me faz lembrar imediatamente do meu querido avô, que faleceu a alguns poucos anos.

    Não me esqueço dos domingos que passávamos juntos ao som daqueles carros de corrida nas pistas. Era o Senna na telinha e eu com meu avô, que vibrava, babava com suas vitórias!

    Ver o meu avô feliz era tudo de bom – e o Senna proporcionou a ele muitas alegrias…

    Por isso, fiquei muito emocionada com o seu post. Muito mesmo!

    Bjos e até breve, minha querida!

    http://deixafluir.wordpress.com/
    http://fluindolhar.blogspot.com/

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  9. Jogos de Meninas comentou, em 09/06/2009:

    Muito inspirador o seu artigo, parabéns!

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