Reflexão para o Ano Novo: O valor de pai e mãe

Criado por Letícia Castro em em 31/12/2009

Do que você é feito? De onde vem e do que é constituído? Já parou para pensar que, muito além de informação genética, você tem hábitos, gestos e maneiras de seus pais? Já fez o teste de ficar se olhando no espelho para tentar reconhecer quais traços tem de um e de outro? Eu já, e olha que no meu caso é um pouco mais complicado. Os olhos são da minha mãe, sem dúvida (o mau gênio também…). Dizem que a boca é pequena como a do meu pai e tenho o ar dele, mas o melhor elogio que ja recebi na vida em relação a ser parecida com ele foi quando ganhei uma queda-de-braço com um vendedor de móveis, que me disse: você é filha do “Seu” Ronaldo mesmo!

Durante bom tempo da minha vida, meu pai foi vendedor de livros. Jurídicos. Se isso não me influenciou, não sei mais o que poderia, pois ao meu tempo virei jornalista. E me casei com um advogado. Minha mãe foi quem me ensinou a ler, antes de entrar para a escola. E os dois foram moldando meu caráter e meu modo de ser, de agir. Logo de cara, me ensinaram que eu tinha que me virar sozinha. Nunca me esqueço de um dia, numa velha infância, em que briguei com um garoto e ele me bateu. Briguenta como eu só, não entendo por que não me defendi naquela ocasião, voltei para casa chorando e contei tudo para a minha mãe. E ela me disse da porta de casa mesmo, sem me deixar entrar: volta lá e vai resolver seu problema com ele. E se ainda voltar chorando, eu te bato! Doce jeito espanhol… Voltei, contei tudo indignada ao pai da criatura. Quebrei a cara, mas saí fortalecida.

Morando em São Paulo, a gente aprende a se virar ainda mais e logo cedo. Nunca me lembro de meu pai e minha mãe me levando aqui e ali, tinha que ir de busão mesmo. Comecei a trabalhar aos 14 anos e nunca mais parei, em nenhum momento de minha vida, nem quando me preparei para ficar sem trabalhar por algum tempo quando mudei radicalmente de profissão e abracei o jornalismo completamente. Vício de quem ficava com vergonha de faltar à escola, de tirar nota baixa ou de ter que “implorar” dinheiro para os pais para comprar bobagens (o sermão não compensava). O jeito era me virar sozinha mesmo, então logo comecei a trabalhar e as coisas foram acontecendo.

Minha mãe costumava dizer que eu sou tão independente que nem mamei na teta dela. Teta mesmo. Acho que ela queria ter essa sensação do animal que extrai o alimento do próprio corpo para a sobrevivência da prole. Vai saber por que não mamei em minha mãe, mas dizem que eu segurava com firmeza a mamadeira. Tinha pressa talvez. De crescer, de fazer tudo o que eu tinha e precisava fazer na vida. Tanta coisa para aprender e fui trilhando o meu caminho, correndo um dia atrás do outro. Me parecia muito feio ficar dando trabalho para os meus pais, ficar precisando, importunando a eles e é claro que o fiz várias vezes, mesmo quando pensei que estava contribuindo.

O fato é que, depois de mulher feita, estou aqui há mais de um mês na casa dos meus pais, que moram em outra cidade. Precisei deles sim. Um problema técnico (meu pc pifou e não tinha ninguém que pudesse me emprestar outro até o conserto) me trouxe de volta para cá para uma longa temporada. Voltei sem jeito, pois fazia pouco tempo que tinha estado com eles e ficar outra vez na sua casa e por mais tempo ainda não me parecia muito confortável. Mas, como o que não tem remédio… fiquei e fui ficando e hoje, no último dia do ano, entendi por que Deus preparou que eu viesse.

Deus preparou… Minha avó paterna sempre dizia isso e ela tinha razão. A reviravolta que aconteceu na minha vida nesses 30 e poucos dias já estavam escritas sim. Mãos muito especiais me trouxeram para o colo de minha mãe e de meu pai mais uma vez e, como dedos invisíveis, foram moldando a argila que me forma como quando minha mãe ainda me esperava. Meus pais pegaram essa mulher grande, que estava em cacos, sem direção, e a colocaram de pé de novo. Resolveram cada pendência em minha vida diante da minha impotência, pois eu vim cansada, física e espiritualmente. Quando se tem 36 anos, algumas coisas já nos cansam mais do que antes e a força de lutar às vezes arrefece. E eu me deixei levar e permiti que o meu “velho” e a minha “velha” (eu vou ouvir por isso) tomassem a frente e cuidassem de mim. Não sem dor, pois sou difícil de aceitar ajuda, se bem seja um aprendizado que estou incorporando a cada dia. Mas, me entreguei. Cheguei engatinhando e só batia contra a parede. Hoje já consigo andar e estou louca para conquistar o mundo de novo, como se viver esse 2010, que chega tão cheio de possibilidades, fosse descobrir o resto da minha vida novamente.

Talvez o seja e sinto que é. O que queria realmente dizer é que, se eles não tivessem me pegado no colo, mais uma vez, provavelmente eu não cruzaria esse 31 de dezembro assim mais forte. E é bonito ver que você pertence, que você tem a eles, que é deles, não importa o que aconteça, mas, principalmente, que você se vê neles. Nesse 2010 que se inicia, a única coisa que eu espero é que eu consiga tirar forças de onde não tenho, assim como os meus pais, para olhar para a vida de frente e ainda poder ajudar. Se alguma coisa fica é o que vejo nos olhos de minha mãe, meu espelho, e no espírito de meu pai, meu norte. E também o que quero para mim de hoje em diante, pois não tenho mais medo de seguir em frente. Nem de fraquejar, se for preciso.

Se você ainda tem os seus pais por perto, corra e dê um abraço neles. Beije-os muito, dê um telefonema, diga “eu amo vocês” em vez de alô, e não retenha mais um segundo esse sentimento no seu coração. Se eles já estão juntos do Pai Maior, então revista-se do seu reflexo e dê continuidade, através dos teus atos, ao exemplo de amor, força e dignidade que te deixaram. É só disso que precisamos para viver o resto de nossas vidas, a partir de amanhã.

Feliz 2010 a todo o mundo é o que deseja o BABEL.com!

Este texto é dedicado com todo o amor que sinto ao Seu Ronaldo e à Dona Silvia, meus heróis, minha razão de ser.

Imagem: BRFoto

Aqui se fala português.
Comentários (11)
  1. Wander Veroni comentou, em 31/12/2009:

    Oi Lê!

    Puxa vida: que texto, hein! Um senhor editorial. Confesso que estou aliviado de saber que está tudo bem com você e que vc está no lugar certo: na caso dos seus pais.

    Amo muito os meus e sei que é sempre com eles que posso confiar. Fico muito contente de ver que essa minha amiga ariana e, às vezes, meio cabeça-dura, se permitiu e buscou ajuda.

    Bom, nem preciso falar que estou sempre aqui pro que der e vier, né! Todo mundo passa por problemas e, como lhe falei outro dia, é hora de mudar. Nada acontece na nossa vida por acaso. Tudo tem um motivo.

    E, do fundo do meu coração, desejo que 2010 seja o seu ano. Ano que vc possa se dedicar por completo a você. Não se trata de egoismo, viu. É coisa de amor próprio e de se permitir outra vez.

    Espiritualmente estou aí com vc, pode acreditar!

    Todo mundo aqui de casa está mandando um abração pra vc do tamanho do mundo, viu!

    Beijão e feliz 2010!

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  2. Silvia comentou, em 31/12/2009:

    Lê, minha filha querida.

    Nem que eu fosse a maior poetisa, nem mesmo assim encontraria palavras para descrever o que estou sentindo nesse momento.A única coisa que vou conseguir dizer agora, é que sempre que se sentir fragilizada, sem rumo, venha até nós, pois somos FORTES com a FORÇA que nos vem de DEUS. Deus mandou um monte de Anjos para a terra e deu-lhes o nome de PAIS para que assim pudessem tomar conta de seus filhos. AMO VOCÊ minha filha e fico muito feliz em saber que hoje, você está se sentindo forte e pronta para enfrentar o ano de 2010 que logo se iniciará. DEUS E NOSSO SENHOR JESUS CRISTO TE ABENÇOE E ILUMINE O SEU CAMINHO HOJE E SEMPRE.

    TU MAMITA

    Silvia

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  3. Catarino comentou, em 31/12/2009:

    Letícia.
    Nossos pais são sempre a melhor porto para retornarmos.
    Parabéns pela linda homenagem que fez aos seus.
    Tenha um Ano Novo com tudo que há de bom.
    Abraço

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  4. Jorge Fortunato comentou, em 31/12/2009:


    que lindo texto! Fico envaidecido de ser seu amigo.
    Um beijo enorme, um abraço bem apertado e um belo sorriso do
    Jorge, o carioca que espera um dia mostrar as belezas do Rio para a amiga de Sampa

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  5. Rodrigo Piva comentou, em 31/12/2009:

    Che bello testo, Lê!!!
    Isso que é homenagem, hein? Um dia consigo fazer algo parecido!! :-)
    Beijão per te e que seu 2010 seja repleto de saúde, amor, paz e felicidade!! E claro, sem problemas de informática! hehehe
    Bacione! Feliz Ano Novo!!

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  6. Histórias & Estórias comentou, em 01/01/2010:

    Sim, um belo e delicioso texto que a gente sente quando degusta cada letrinha.

    Beije seus pais por mim. Porque os meus se foram uns meses aqui pra traz… é uma saudade doída – miudinha mesmo – que corre em cada cantinho da alma da gente.

    Beije-os muito, viu. Diz que fui eu quem mandei.

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  7. Lilian comentou, em 01/01/2010:

    Olá amiga,

    Parabéns pelo texto maravilhoso e profundo. Cada palavra lida, um sentimento paralelo à minha vida.

    Pais, a melhor parte de nós, enquanto filhos. Já não os tenho comigo. Partiram cedo para a Morada Celestial. Aproveite bem a ccompanhia e o amor dos seus.

    Feliz recomeço em 2010!
    Fraterno e carinhoso abraço,
    Lilian

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  8. Antonio Regly comentou, em 01/01/2010:

    Letícia,

    Fiquei encantado com seu post, pelo reconhecimento aos seus pais como espelho e norte (mãe e pai) e tudo mais.
    Há pouco mais de 5 anos minha mãe se foi. Mas ainda nos últimos dias, mesmo debilitada com a doença, me pedia para sentar no colo dela para dizer “que saudade do meu filhão!” Recebia, então, seus afagos e conselhos.
    Meu pai está com 81 anos e é também meu amigo, conselheiro, humorista e incentivador. Fico maravilhado quando telefono para ele e me pede para aguardar ligar de volta: “estou fazendo o meu culto e orando por todos vocês; daqui a pouco ligo de volta”. E telefona, e conta como foi o seus. Mas antes sempre pergunta: “como você está meu filho?”
    Sempre que vem me ver traz uma coisinha: às vezes legumes, frutas ou verdura. Se viaja para Minas, sempre traz um queijinho ou pó-de-café “dos puros”.
    Curta seus pais o quando a vida lhe permitir. Onde encontro o meu tomo-lhe a bênção, beijo seu rosto, não importando o lugar onde estou. É o meu pai, o tesouro que amo muito.

    Lindo post!

    Abraço do amigo,

    Antonio

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  9. Viviane Righi comentou, em 04/01/2010:

    Querida amiga,

    Foi lindo passar por aqui e encontrar essa coisa maravilhosa que você escreveu. Você está certíssima ao reconhecer que precisou de ajuda e ter se entregado a ela. E ajuda de papai e mamãe, quem não precisa? Eles realmente são o nosso porto seguro (ou deveriam ser…).

    Minha relação com a minha mãe é perfeita, graças a Deus. Temos uma cumplicidade e uma relação que ultrapassa as barreiras dos laços sanguineos. Nos entendemos muito bem e sinto que não sou nada quando ela não está por perto… ela me dá forças quando eu preciso, me chama a atenção como se eu fosse uma criança na hora certa, me incentiva nas dificuldades, nos divertimos e choramos juntas também… e o caminho é de mão dupla!

    Infelizmente, isso não acontece em relação a meu pai e confesso que cansei de lutar. Ele é uma pessoa muito difícil e orgulhosa, não aceita o diálogo e nada dá certo se não for do jeito dele. Lá em casa, nós sofremos muito nas mãos dele enquanto crianças devido a seu comportamento egoísta e inconsistente e ainda sofremos! Enfim, prefiro ficar bem afastada dele para evitar choques desnecessários. Talvez por desejar respeitá-lo tanto é que me afasto. Perto dele não teria como evitar conflitos…

    Desculpe o desabafo, mas seu texto acabou me levando a isso. Ah, mas deixa pra lá…

    O que importa é que estamos aqui, felizes da vida, pois apesar das dificuldades normais do nosso dia a dia, ainda temos muito a comemorar…

    Feliz 2010 pra vc, Lelê. Que ele venha recheado de muita paz, saúde, amor e prosperidade para todos nós.

    Bjão no coração!

    Sua sempre comadre…

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  10. Mayara Caparroz comentou, em 22/01/2010:

    Nova seguidora do blog, primeiro comentário :)

    É sempre bom poder contar com quem nós amamos, principalmente se essas pessoas forem tão especiais. As pessoas que nos criaram, que nos deram o dom da vida e que lutam para nos fortalecer a cada novo dia são, sem dúvidas, a melhor coisa do mundo.

    Beijos, Letícia!

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  11. Max Martins comentou, em 04/02/2010:

    Sensacional, Letícia!!!
    Muito bonita e importante a mensagem que você passa em seu texto.
    Acho que muita gente precisa ler esse post.
    Às vezes, na correria do cotidiano, esquecemos das palavras e gestos de amor. Embora, o amor esteja o tempo todo ao redor. Principalmente próximo aos pais.
    Outra coisa que não posso deixar de expor nesse momento, é o alívio que estou sentindo ao ler o seu blog. Explico melhor.
    É muito bem feito e, principalmente, você escreve em Português.
    Sou novo na blogosfera (desde novembro), mas o que tenho visto de crimes contra o nosso idioma é algo que me assusta. Inclusive, em páginas bem conceituadas.
    Gostei demais do seu trabalho e vou acompanhar de perto…sempre que puder.
    Mais uma vez, parabéns!
    Sucesso!

    Como disse Bilac: “Amo-te, ó rude e doloroso idioma”. (Língua Portuguesa)

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